quinta-feira, janeiro 20, 2005

Anos 80

Anos 80: eu vi(vi) e não gostei
De Edson Aran.

O passado não leva ninguém pra frente.
Mas nostalgia dos anos 80 já é apelação. Aquilo não prestou, gente boa. Olha só: o presidente do país era um bigodudo maranhense que parecia chofer de praça. “Toca pra onde, doutor? Ah, Primeiro Mundo não dá não, chefia. Só dá pra ir pro Terceiro e, ainda assim, com bandeira dois.”

A inflação era de 300% ao mês. De quinze em quinze dias, mudava o nome da moeda. Começou com Caraminguá, depois virou Caraminguá Novo (com três zeros cortados), depois Cracatua e, finalmente, Cracatua Nova (seis zeros a menos). No final da década, já tinha supermercado aceitando pagamento em tampinhas de garrafas, conchinhas e bolas de gude.

E a vida cultural, então? O país era tão atrasado que tratava crítico de música feito gente! Toda manhã, o indivíduo chegava ao jornal (depois de uma noite tórrida com o Ditão, do caderno de Esportes), sentava (de ladinho) e inventava moda. A gente acordava yuppie, virava neo-punk e terminava a noite como dark. Quanto não estava muito inspirado, o crítico de música pegava uma matéria da Rolling Stone, traduzia e assinava. Isso era chamado de pós-modernismo e, geralmente, rendia promoção e Prêmio Esso. Afinal, revista estrangeira só tinha na livraria do aeroporto. E cada uma custava o equivalente a uns cinco bilhões de cracatuas.

A primeira formação dos Titãs tinha 365 vocalistas. Eu estava lá e vi. Era mais gente do palco do que na platéia. O roqueiro mais balado do país tinha a língua presa e cantava assim: “Zua ziscina ezá zeia de zatos.” Ou então: “Vais uma záze, é zaro que eu zô a zim...”

Nos anos 80 tudo andou de marcha a ré. Xuxa, por exemplo. Depois de vencer concurso de Panteras e filmar um softporn do Walter Hugo Khoury, voltou a ser virgem. E, já que falamos em vir de ré, a mulher mais cobiçada do país era a Roberta Close. Com todos os originais de fábrica. Só muito mais tarde ela cortaria as jóias da família e daria pro cachorro comer. Sim, tinha o biquíni fio-dental, que era bacana e sacana, mas você nunca sabia o que estava escondido do outro lado da coisa. Encher a mão era mais que um descuido, era quase uma paixão nacional.

Nos anos 80 todo mundo tinha caca na cabeça. Como o corte de cabelo mullet, por exemplo, que era curto na frente e comprido atrás. O pior era agüentar as piadas: “Ah, você deixou o comprido atrás, hahahaha!” Combine isso a paletós gigantescos com ombreiras, gravatas multicoloridas com estampas do Mickey Mouse, óculos de aros vermelhos e você terá uma idéia da desgraça que foi a década.

Só tem saudade dos 80 quem nunca esteve lá. Quem conheceu de perto acorda suando frio e gritando toda noite.

Edson Aran é cronista especialmente convidado do Blog Blônicas. Visite seu site. Blônicas - 12h04 [ (11) Comentários, faça o seu também! ]

Nenhum comentário: